Esse texto que escrevi no início do ano faz parte da Apostila do Curso de Umbanda Nível 2 ministrado por mim todas as quartas-feiras na Tenda de Umbanda Ogum Beira Mar, em Jacareí/SP.
JESUS CRISTO NA UMBANDA
É comum a praticamente todos os terreiros de
Umbanda a imagem de Jesus Cristo no alto do Congá. Mesmo nas casas onde o
sincretismo religioso é deixado de lado e apenas as imagens dos Orixás são
expostas ao culto, existe ali uma imagem de Jesus Cristo. Todos sabemos que no
sincretismo de Umbanda Jesus é Oxalá, mas agora vamos deixar de lado este
conceito, até porque Oxalá é um orixá e representa, portanto, uma força da
natureza, muito mais forte que qualquer pessoa encarnada, seja quem for,
inclusive Jesus. Então por qual motivo existe o culto a Jesus na Umbanda? Seria
um desvio do foco em nossa religião, ou apenas uma forma de respeito ao “filho
de Deus” nas religiões crísticas?
Algumas poucas pessoas na história conhecida
da humanidade tiveram a oportunidade de serem não apenas enviados diretamente
por Deus para pregar Sua palavra, mas principalmente tinham o dom natural de
conversar com Ele. Essas pessoas designamos como profetas. Maomé, Isaías,
Jeremias, Elias, Moisés, Davi são exemplos dessas pessoas. Cada uma teve uma
missão específica, mas em comum todas tinham a comunicação direta com Deus, não
apenas través das orações, como todos nós também conseguimos fazer, mas uma
real comunicação, com diretrizes dadas diretas pelo Criador.
Jesus também tinha esta característica,
porém, diferente de todos os outros que descobriram em vida suas missões, e
eram fragmentadas, a Jesus foi dado a possibilidade de encarnar já sabendo de
sua missão, que era levar a palavra de Deus para a humanidade, enterrando as
más interpretações que aconteciam até então, e focando não apenas no louvor a
Deus, mas na prática da verdadeira caridade entre as pessoas.
Para exemplificar, podemos dizer que é comum
escutarmos nossos amados Pretos Velhos dizendo que devemos amar ao próximo
independente daquilo que nos façam, seja bom ou não. Não podemos escolher quem
ajudar. Tem uma frase dita por Preto Velho que fala: “quem quer ajudar, apenas ajuda. Nada pergunta, nada exige, nada
questiona. Ajuda e passa”. Analisando o contexto desta frase, podemos
colocá-la em comparação a vida levada por Jesus.
Tudo o que o mundo deu a Jesus desde seu
nascimento até seu desencarne foi o pior que podia. Ele nasceu em um estábulo e
teve como primeiro berço uma manjedoura. Aqui vale lembrar que hoje temos a
manjedoura como um símbolo católico, mas uma manjedoura nada mais é do que o
local onde se colocam a ração para o gado dentro de um estábulo. Ou seja, além
de ter nascido em local precário, seu primeiro sono foi basicamente em um
cocho. Foi perseguido a partir do momento que iniciou sua função de
evangelizar. No último dia de vida recebeu flagelo na carne, junto com uma
cruz, a qual nela viu seu corpo carnal morrer. Até mesmo seu túmulo foi
emprestado de José de Arimatéia.
Existe, portanto, ligação direta entre Jesus
e a Umbanda, não apenas com os Pretos Velhos, que notadamente são as entidades
que mais remetem a Jesus, mas com o cerne da religião, que é a prática da
Caridade. Não existiu ninguém mais evoluído a caminhar por nossas terras,
ninguém com maior aproximação de Deus (se é que há como mensurar esse tipo de
situação, claro). Mesmo assim, podendo tudo, tendo a capacidade Divina da cura
através do toque e da fala, com o poder sob todos os espíritos, ao ponto de
expulsá-los das pessoas que obsediavam; mesmo assim viveu em pobreza material,
mas em abundante prosperidade espiritual, conforme disse o Apóstolo Paulo em
sua carta: “pois conheceis a graça de nosso
Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que,
pela sua pobreza, vos tornásseis ricos” (Cor 8,9).
É por isso que Jesus Cristo não é apenas respeitado, mas
cultuado na Umbanda, pois representa a Caridade encarnada e, acima de tudo, um
norte que todo umbandista deve seguir para se tornar alguém melhor e desta
forma se aproximar de Deus.
UMBANDA É CRISTÃ OU CRÍSTICA?
Apesar de serem termos parecidos, existe uma grande diferença
entre ser uma pessoa cristã e ser uma pessoa crística. O Cristão é alguém que
segue os preceitos e os ensinamentos do Mestre Jesus de Nazaré. OS católicos e
os evangélicos se baseiam única e exclusivamente na Bíblia e nos passos de Jesus,
então são considerados cristãos.
Em contrapartida temos os ensinamentos crísticos, que são
conceitos universalistas e que pode (e deve) ser seguidos por todos,
independente da religião. Um cristão pode ser uma pessoa crística da mesma
forma que um muçulmano, por exemplo. O que define alguém crístico são os
seguintes pontos:
- É poderoso, mas não exibe poder;
- É puro, mas não vocifera contra os impuros;
- Adora o que é sagrado, mas sem fanatismo;
- É amigo de servir, mas sem servilismo;
- Ama sem importunar a ninguém;
- Vive alegre, mas com grande compostura;
- Sofre sem amargura;
- Goza sem profanidade;
- Ama a solidão, mas sem detestar a sociedade;
- É disciplinado sem fazer disso um culto;
- Jejua, mas não desfigura o rosto para mostrar a vacuidade do estômago;
- Pratica a abstinência de muitas coisas, sem fazer disso uma lei ou mania;
- É um herói, mas ignora qualquer complexo de heroísmo;
- É virtuoso, mas não é vítima da obsessão de virtuosidade;
- Trabalha intensamente, com alegria e entusiasmo, mas renuncia serenamente, a cada momento, aos frutos de seu trabalho.
Jesus tem a denominação de Cristo justamente por ser
considerado o “Cristo Planetário da Terra”, ou o símbolo na Terra do homem
crístico. Alguns crísticos creem que Maomé, Buda, Krishna, Kardec, Confúcio,
entre outros, assim como Jesus de Nazaré, são “prolongamentos vivos do Espírito
Crístico”, que seria uma energia emanada que representa os conceitos
apresentados acima, sendo que essas pessoas conseguiram, mesmo sofrendo as
mesmas intempéries que outros em suas respectivas épocas, encarnar o que há de
melhor no ser humano, através desta vibração crística.
Através deste breve resumo, podemos entender que a Umbanda
não é uma religião cristã, mas sim uma religião crística que pode, sim, ter
como base muitos conceitos do cristianismo interpretado da Bíblia Sagrada, mas
sempre nos caberá uma vigília ainda maior por sermos universalistas e termos a
obrigação de ajudarmos a todos, sejam cristãos, muçulmanos, taoistas, budistas,
ou qualquer outra religião. Nossos atos devem sempre superar os dogmas.
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